Os preços do petróleo e a vacilação do governo

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Celso Ming

As enormes oscilações dos preços do petróleo que se seguiram ao assassinato do general iraniano Qassim Soleimani pelos Estados Unidos e, nesta terça e quarta-feira, os ataques do Irã a bases americanas no Iraque mostram duas coisas: mudanças na geopolítica do petróleo, que tendem a reduzir o impacto sobre as cotações internacionais, e a falta de clareza da política brasileira em relação aos preços internos dos derivados.
O mundo está cada vez menos dependente do petróleo produzido pelas regiões do Golfo Pérsico. A mudança de maior impacto imediato é a disparada da produção de petróleo e gás de xisto nos Estados Unidos, que corresponde hoje a quase 60% da produção do país. Os Estados Unidos não só passaram a ser autossuficientes, mas, também, passaram a ser
exportadores líquidos de petróleo e derivados.
Como os custos de produção desse óleo de xisto são relativamente altos, o cartel da Opep chegou a adotar a tática de aumentar a oferta para reduzir os preços e, dessa maneira, alijar do mercado os produtores dos Estados Unidos. Foram atingidos apenas os menos eficientes. O resultado geral foi aumento da eficiência do setor, redução dos custos, aumento da produção e menor dependência de suprimento da Opep.
Mas há mudanças de mais longo prazo que vêm reduzindo a importância geopolítica do óleo proveniente do Oriente Médio. O mundo caminha mais rapidamente do que o esperado para substituição de combustíveis fósseis por combustíveis renováveis de baixo impacto ambiental.
Apesar dessa perda de importância relativa da Opep, os preços continuam sujeitos a solavancos a cada episódio que coloca em risco setores da segurança da região por cujo estreito (Ormuz) passam 20% do petróleo consumido no mundo.
Em parte, esses solavancos parecem puro reflexo condicionado: os agentes do mercado reagem com fortes altas mais porque estão acostumados a isso do que em consequência do impacto real do ocorrido na oferta de petróleo. Tanto assim, que os preços refluem diante do primeiro sinal em contrário, como nesta quarta-feira, quando o presidente Trump tuitou, depois do contra-ataque do Irã, que “está tudo bem”.
A outra questão é a falta de clareza do governo brasileiro a respeito da política de preços dos combustíveis. Neste momento, a Petrobras tem oficialmente autonomia para definir as condições de mercado. Mas, na prática, o governo não quer vê-los subir abruptamente quando as cotações do produto ou da moeda estrangeira sobem também abruptamente, como nos últimos dias. No momento, teme o impacto da alta sobre os custos do transporte rodoviário, que, em 2018, culminou nas paralisações de caminhoneiros.
Este e outros governos tentaram de tudo. Impuseram congelamentos de preços amarrados a uma Conta Petróleo por meio da qual as perdas da Petrobras eram ressarcidas pelo Tesouro. Outras vezes, subsidiaram os combustíveis à custa do caixa da Petrobras. Em 2001, o governo FHC criou a Cide, contribuição embutida nos preços que funcionaria como amorte­cedor: aumentaria quando estivessem baixos e cairia se estivessem altos. Mas,
desde a greve dos caminhoneiros, a Cide foi zerada e já não funciona como meca­nismo de compensação.
A Petrobras prepara a privatização de oito de suas refinarias. Além disso, o País precisa de novas. Esses investimentos não podem ser prejudicados pela imposi­ção de preços artificiais.
Agora, mais por falta de determinação do que de opção, o governo pretendeu em­purrar a conta da alta para os Estados. Quer que eles reduzam o ICMS sobre os combustíveis, que hoje pesa cerca de 24% a 32% sobre os preços. Embora essa alta carga tributária já venha prejudicando a economia porque incide sobre insumos de grande importância para o sistema pro­dutivo, os Estados estão praticamente quebrados e não podem abrir mão de receitas.
Se o problema dos caminhoneiros não é de custos operacionais, mas de cami­nhão demais para carga de menos, não
vai ser pela criação de subsídios a serem descarregados sobre o Tesouro ou sobre a Petrobras que virá a solução. A solução virá com o crescimento econômico, que aumentará a demanda por cargas, e com o aumento da concorrência no refino e na distribuição de derivados. Até lá, é preci­so aguentar os trancos.

Celso Ming é jornalista da Agência Estado, espe­cializado em economia.

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