Crítica: “Corra!” escolhe um alvo inusitado para falar de racismo

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    Divulgação/Universal

    Logo no começo de “Corra!”, um jovem negro está andando sozinho pelas ruas de um subúrbio americano. Um carro se aproxima vagarosamente e para ao seu lado. Em vez de se fazer de curioso e se aproximar do carro, como de praxe num filme de terror, ele solta um singelo “nem fudendo!” e faz de tudo pra deixar essa ameaça pra trás. É uma introdução brincalhona, que usa da metalinguagem para dizer que o que vem por aí foge do comum.

    Na cena seguinte conhecemos Chris (Daniel Kaluuya) e Rose (Allison Williams), um casal prestes a fazer uma peregrinação importante: passar um fim de semana na casa dos pais de Rose, para que estes conheçam seu namorado. Nenhum dos dois está preocupado com a situação, mas Chris fica insinuando que o encontro será um pouco diferente do que ela espera. Afinal de contas, Rose é branca. E Chris é negro.

    Conflitos e tensões raciais no cinema americano geralmente se dão em cenários povoados com personagens conservadores e explicitamente racistas. São filmes que lidam com escravidão, com a luta por direitos civis ou mesmo com a desvalorização da pessoa negra pela sociedade em que ela habita. A inovação de Peele é ter uma história sobre o racismo num casa completamente liberal e “evoluída”.

    As surpresas da trama de “Corra!” não merecem ser reveladas numa crítica. Sua sátira, porém, está presente desde o começo, quando o carro de Chris e Rose é parado, mesmo sem infringir nenhuma lei, por um policial branco.

    A satisfação exibicionista de Rose em defender seu namorado serve para mostrar que o ato não existe pra livrá-lo, mas sim para aumentar as credenciais de Rose perante a comunidade negra. A crítica não vai pro branco que chicoteia um negro, mas sim para aquele que olha em seus olhos e, na maior sinceridade, diz: “eu entendo a sua luta”.

    Por último, vale lembrar que o tom é um misto de terror e comédia, uma bela mistura de gêneros para uma crítica ácida.

    Avaliação: Ótimo

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