Decisão discutível

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No final da semana passada, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello, atendendo a um pedido de habeas corpus dos advogados de defesa de André Oliveira Macedo, o André do Rap, expediu uma liminar que permitiu a soltura de um dos chefões do Primeiro Comando da Capital (PCC) em São Paulo, possivelmente a maior facção criminosa do País, atuando dentro e fora dos presídios.

Vista de maneira fria, a decisão de Marco Aurélio foi técnica. O ministro entendeu que houve excesso de prazo na prisão do traficante, que ainda não tinha sentença condenatória definitiva.

A prisão de André do Rap foi feita pela Polícia Civil de São Paulo em 2014, quando ele foi localizado em Angra dos Reis.

Ele foi acusado na oportunidade de ser um dos dirigentes da facção e de comandar o esquema de tráfico no Porto de Santos, talvez o mais importante ponto de exportação de drogas da quadrilha, que leva a cocaína da América do Sul para outros continentes e uma das operações mais lucrativas do bando.

De sua prisão até hoje, o traficante já foi condenado em segunda instância a uma pena de dez anos de prisão, ainda passível de recurso. Ao assinar sua liberação, o ministro destacou que se passaram 90 dias sem que se fosse apresentada motivação suficiente para a manutenção da prisão, o que infringia o Código Penal.

O ministro Marco Aurélio usou a letra fria da lei para tomar sua decisão, uma vez que parece evidente que ocorreram falhas por parte da Justiça o processo. Só não atentou para a extrema periculosidade do réu e a gigantesca repercussão que o caso teria na opinião pública e nos meios políticos.

Ao ser solto, Macedo indicou o endereço de sua residência à Justiça e de onde poderia atender aos chamados judiciais. Na prática, como diz a bandidagem, ele caiu no mundo e há informações de que, poucas horas depois, já estaria escondido no Paraguai ou outro país vizinho.

Diante da enorme repercussão do caso, o presidente do STF, Luiz Fux, atendeu ao pedido da Procuradoria-Geral da República e suspendeu a decisão liminar de Marco Aurélio Mello e determinou a imediata volta do traficante ao sistema prisional, que também tem outras condenações.

No despacho do presidente do STF, a soltura de André do Rap “compromete a ordem e a segurança públicas”. E observou que ele é de comprovada altíssima periculosidade; tem dupla condenação em segundo grau por tráfico internacional de drogas e participação de alto nível hierárquico em organização criminosa.

Assim que a decisão liminar foi suspensa por Fux, a polícia paulista montou uma operação especial para tentar recapturá-lo. O acusado é suspeito de ter um patrimônio de R$ 17 milhões e se apresentava como agente de artistas e jogadores de futebol para disfarçar a origem do patrimônio.

André do Rap teria inúmeros contatos com quadrilhas internacionais, inclusive com a “Ndrangheta”, a máfia calabresa, que recebia a droga para distribuí-la na Europa.

Esses relacionamentos o ajudam a encontrar esconderijos em vários países. Esses aspectos da vida do acusado, que mostram que se trata de um bandido perigosíssimo, precisariam ter sido analisadas pelo ministro Mello antes de expedir a liminar que possibilitou a soltura.

A repercussão da soltura do traficante e a posterior suspensão da liminar por Fux foi igualmente grande. No governo a reação contra a soltura do André foi Rap foi também forte, assim como no Legislativo, onde dividiu opiniões.

A medida levou um grupo ligado ao presidente Bolsonaro, a articular a apresentação de projetos de lei para retirar do Código de Processo Penal o dispositivo que determina que, a cada 90 dias seja revista a decisão de manter a prisão preventiva de um acusado de crime. Houve reação forte no próprio STF.

Segundo observadores, ainda que muitos ministros discordem da forma como Fux suspendeu a validade da liminar de Marco Aurélio Mello, concordam que o chefe do PCC não deveria ter sido solto e, de forma pragmática, se alinharam a Fux.

Lembraram que, no final do ano passado, Marco Aurélio Mello mandou soltar todos os que haviam sido presos em segunda instância, em obediência à interpretação do STF, o que obrigou o então presidente, Dias Toffoli, a sustar a liminar.

De um tempo a esta parte, juízes e tribunais passaram a se destacar na mídia e na política ao lado do Executivo e do Legislativo.

E o STF, a Corte Suprema do País, se tornou o ente de maior projeção a partir do julgamento do Mensalão, a Ação Penal 470, a partir da qual os outros poderes passaram a frequentar com alguma regularidade o banco dos réus.

Desde então, o STF passou a arbitrar crises e escândalos criados pelos outros poderes e passou, ele também, ser palco de disputas políticas.

Medida como essa adotada pelo ministro Mello, atrai ainda mais os holofotes para a Corte, mas de maneira extremamente negativa.

 

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