Justiça holandesa vira esperança de vítimas do afundamento em Maceió

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Famílias afetadas pela dramática tragédia causada pela mineração e que faz bairros inteiros afundarem lentamente em Maceió estão apelando à Justiça fora do Brasil na esperança de conseguir indenizações que considerem justas em um processo que não se arraste por décadas.

A Justiça da Holanda realiza uma audiência nesta terça (17/5) para decidir se aceita o pedido desses brasileiros de processar a petroquímica Braskem, dona das minas de sal-gema que colapsaram no subsolo da capital de Alagoas e obrigaram mais de 50 mil pessoas a abandonarem suas casas, deixando a cidade cheia de bairros-fantasma.

A tragédia em Maceió foi gestada por décadas, à medida em que imensas minas subterrâneas eram cavadas e exploradas na área urbana da capital, e se manifestou por volta de 2018, quando ficou claro que as rachaduras que rasgavam ruas e imóveis de bairros nas proximidades da Lagoa Mundaú estavam sendo causadas pela mineração.

Ainda que tenha resistido a admitir sua culpa pelo episódio, a Braskem, atual dona do complexo de minas, assinou acordos com autoridades brasileiras e financia a retirada de ao menos 15 mil famílias das áreas afetadas. Os acordos definitivos de indenização, entretanto, ainda são uma questão em aberto, e mais da metade das vítimas ainda não aceitou o que foi ofertado pela empresa.

Em reportagem especial sobre o tema publicada em maio de 2021, o Metrópoles relatou que as vítimas relutavam em deixar os bairros nos quais viveram a vida inteira e reclamavam dos valores oferecidos pela Braskem como indenização, que não seria suficiente sequer para comprar imóveis do mesmo padrão dos que estavam sendo abandonados.


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A falta de perspectivas de um acordo melhor motivou parte das vítimas a se interessar pela oferta de uma ação coletiva fora do Brasil, proposta por um escritório de advocacia especializado nesse tipo de iniciativa, e que já foi à Inglaterra representar vítimas da tragédia causada pelo rompimento de uma barragem da Samarco em Mariana (MG), em 2015.

A Holanda é sede da subsidiária europeia da Braskem e a ação do escritório de advocacia PGMBM argumenta que as vítimas da empresa em Maceió não estão tendo acesso à Justiça no Brasil e têm na tentativa de processo internacional talvez a única chance de serem devidamente atendidas em suas demandas.

Essa é a expectativa do líder comunitário Augusto Cícero da Silva, de 65 anos, que precisou deixar o bairro do Bebedouro após três décadas construindo sua história no local depois que o imóvel em que morava com a família e a mercearia que operava para se sustentar foram condenados.

“Eu não estava com meus imóveis à venda. Nenhum dos meus vizinhos estava. Fomos obrigados a sair e o que foi oferecido como indenização por dano moral eu achei um absurdo”, conta ele, que vive há quatro anos em um imóvel que tem o aluguel pago pela Braskem enquanto as partes não chegam a um acordo final.

“Com o que eles pagam, tive de vir para um bairro distante de onde eu morava, há mais de duas horas no transporte público da sede da nossa associação comunitária, que é um lugar onde eu chegava em minutos antes de ser retirado”, relata Silva, que também não conseguiu reabrir seu comércio em outro local.

“Me sinto muito mal com o que aconteceu, por isso aceitei essa proposta de ação coletiva na Holanda. Eu vivia em um bairro tradicional, tinha amigos, tinha uma história, um sustento. Dinheiro nenhum paga nossa história, mas as ofertas que a Braskem fez eu achei um absurdo.”

Em busca de rapidez e de indenizações maiores

O advogado Pedro Martins, sócio do PGMBM, explicou ao Metrópoles que cortes europeias têm mais agilidade para lidar com grandes causas coletivas e que o objetivo da ação internacional é fugir de “um sistema processual complexo, cheio de recursos e que dá aos réus vantagens injustas e capacidade de arrastar a ação por décadas”.

“No Brasil, não há a tradição de olhar para as vítimas de forma a compensá-las com valores condizentes com o dano causado. Aconteceu com as vítimas de Mariana e tivemos nossa ação aceita na Inglaterra”, completa ele, antes de dizer que a “duração razoável” de um processo como esse nas cortes da União Europeia é de sete anos.

“No Brasil, com todas as instâncias, é muito difícil um processo assim acabar antes de um período de 20, 25 anos. E não é aceitável essa espera para essas famílias”, avalia.

A empresa diz já ter sete mil clientes entre as vítimas da tragédia em Maceió, mas iniciou o processo que será avaliado nesta terça por um juiz com o caso de 11 deles. “É uma ação-piloto, que esperamos que seja aceita e dê aos clientes indenizações justas. Estabelecida a responsabilidade, esperamos replicar”, completa o advogado, que critica o modelo de indenização proposto pela Braskem.

“Eles estão basicamente comprando o patrimônio das vítimas. Se todos aceitarem, a empresa terá comprado 6% da área urbana de uma capital brasileira por valores módicos”, afirmou ele.

Na ação que terá sua admissibilidade avaliada nesta terça por um juiz holandês, a PGMBM tem ainda o apoio das bancas Araújo Máximo Advogados Associados e Omena Advocacia.

Procurada pelo Metrópoles, a Braskem não se manifestou sobre o mérito da ação na justiça holandesa. “A primeira audiência da ação ajuizada na Holanda por alguns moradores de Maceió, em 2020, será realizada amanhã com o comparecimento de representantes da empresa, que acompanha o processo e tem apresentado suas manifestações nos autos”, informou a empresa, que tem a Odebrecht e a Petrobras como principais acionistas.

Veja vídeo produzido pela reportagem no Metrópoles nos bairros-fantasma de Maceió:

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