O setor de aviação brasileiro parece ter deixado a pior turbulência para trás e segue para um voo mais tranquilo em 2023. Depois de passarem por um longo período em que as receitas foram praticamente a zero e os custos seguiram vigentes, as aéreas brasileiras Gol e Azul conseguiram tirar das costas parte do peso das dívidas acumuladas nos últimos três anos.
Em acordo recente, a Azul conseguiu negociar com os arrendadores das aeronaves quase 90% da dívida de R$ 3,8 bilhões que pesava no balanço. Apesar de os aviões terem ficado no chão, os aluguéis continuaram a ser cobrados, o que criou uma bola de neve no endividamento da empresa.
Com a renegociação, a aérea transformou 60% da dívida em ações e alongou os 40% restantes para um pagamento que vence em 2030. A consequência imediata, segundo disse John Rodgerson, CEO da Azul, é que a empresa deixará de “queimar” R$ 3 bilhões em 2023 – dinheiro que seria usado para amortizar ou quitar os débitos que venceriam no curto prazo. Ou seja: mais recursos disponíveis para investir no aumento da oferta de assentos e, assim, conseguir gerar caixa.
“O adiamento da dívida compensa a diluição dos investidores (em razão da conversão de parte da dívida em ações), tornando esse um evento positivo para a Azul e, mais importante, retirando o peso causado pela possível necessidade de reestruturação financeira”, observou o analista do banco BTG Pactual Lucas Marquiori.
A Gol fez uma operação similar. A controladora da companhia aérea brasileira, a holding Abra (que também controla a operação internacional da Avianca) concederá um financiamento de US$ 1,4 bilhão, ou cerca de R$ 7,3 bilhões na atual cotação do dólar. A nova dívida terá como prazo março de 2028 e não poderá ser executada antecipadamente. O impacto financeiro da renegociação não foi divulgado pela empresa, mas espera-se que o resultado final seja o mesmo da Azul: aliviar o caixa.
Os investidores ficaram animados com o cenário que se abre. No último mês, as ações da Azul subiram 76% e as da Gol avançaram 25%.
As conversas para reduzir e renegociar as dívidas do setor são um importante passo para afastar as aéreas de um processo de recuperação judicial. Desde que a crise de crédito da Americanas veio à tona, bancos adotaram políticas mais rigorosas para a concessão de recursos e para a rolagem de débitos. O fato de a Azul e a Gol terem conseguido renegociar diretamente com seus credores ou controladores é uma boa notícia, uma vez que o setor parece fugir da confusão que se instalou no mercado de crédito local.
Custos elevados
Apesar do pior ter ficado para trás, as notícias para os passageiros não são as esperadas. As renegociações de dívidas aliviam o custo financeiro para as empresas, mas ainda há um custo operacional crescente que tende a tornar as viagens mais caras ao longo do ano.
O primeiro ponto é o custo do combustível das aeronaves. Havia uma expectativa de queda do preço do petróleo ao longo de 2023, o que poderia aliviar as despesas com o querosene para as aéreas. No entanto, a crise dos bancos nos Estados Unidos e na Europa deve frear a política de aperto monetário dos bancos centrais de países desenvolvidos, o que deve dar um fôlego extra à cotação do petróleo.
Além disso, a turbulência no exterior também tem afetado o dólar, o que não só impacta o petróleo como os contratos de arrendamento das aeronaves, que são firmados em moeda estrangeira.
Tudo isso indica que as companhias serão mais cautelosas na ampliação do número de voos. A tentativa de recompor margens também é outro sinal de que os passageiros enfrentarão um cenário de bilhetes mais caros.
Segundo dados da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), as passagens estão, em média, 30% mais caras do que antes da pandemia. Em trechos muito demandados, como a ponte-aérea (São Paulo e Rio) e Brasília, é comum encontrar tarifas acima de R$ 3 mil.
Embora a recuperação das empresas seja uma boa notícia para o consumidor, que continuará a ter opções para voar, o cenário de 2023 não parece animador para o bolso.
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