Aproximação com Maduro causa mal-estar e atrapalha planos de Lula em unir continente

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A questão da Venezuela eclipsou os esforços do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para promover a integração dos países sul-americanos em torno de objetivos comuns. Lula foi anfitrião de um encontro de cúpula nesta terça (30/5) que recebeu outros 10 chefes de Estado em Brasília e falou de metas ambiciosas, como a criação de uma moeda para o continente negociar com o resto do mundo. Mas a presença do venezuelano Nicolás Maduro e a defesa pública que o petista fez dele se tornaram o assunto principal e fonte de desacordo entre presidentes vizinhos.

Um dia antes da cúpula dos chefes de Estado, na segunda (29/5), Lula recebeu Maduro para um encontro bilateral no Palácio do Planalto e minimizou as denúncias de violação dos direitos humanos na Venezuela. Para o presidente brasileiro, Maduro e seu regime seriam vítimas de uma “narrativa” sobre ausência de democracia.

Veja:

A defesa aberta de Lula ao venezuelano incomodou parte dos presidentes convidados para o encontro do dia seguinte. A voz mais dura a se levantar contra o discurso do brasileiro foi a do presidente do Uruguai, Luis Lacalle Pou, que transmitiu pelo Instagram as críticas a Lula feitas em reunião fechada no Palácio Itamaraty, sede do Ministério das Relações Exteriores do Brasil.

Lacalle Pou não chegou a citar o nome de Lula, mas disse que ficou “surpreso quando se falou que o que acontece na Venezuela é uma narrativa”.

“Todos já sabem o que pensamos a respeito da Venezuela e ao governo da Venezuela. Agora, se há tantos grupos no mundo que estão tratando de mediar para que a democracia seja plena na Venezuela, para que se respeitem os direitos humanos, para que não hajam presos políticos, o pior que se pode fazer é tapar o sol com um dedo”, disse o presidente uruguaio, que é de centro-direita.

Veja:

O outro presidente a levantar a voz contra a fala de Lula, porém, é de esquerda, como o brasileiro: o chileno Gabriel Boric. Na mesma reunião que tinha apenas os chefes de Estado do continente, Boric afirmou que é “impossível fazer vista grossa para as violações de direitos humanos na Venezuela”.

Apesar de ter dito ser positiva a presença de Maduro em organismos multilaterais, Boric disse que não se pode “colocar para debaixo do tapete ou fazer vista grossa sobre assuntos que são de princípios importantes” e que manifestou “respeitosamente uma discordância com o que o presidente Lula disse ontem, de que a situação de direitos humanos na Venezuela é uma construção narrativa. Não é uma construção narrativa, é uma realidade, é sério”, salientou.

As falas de Lacalle Pou e Boric fizeram pesar o clima na reunião e esfriaram a ideia de Lula de reviver um organismo multilateral entre os países sul-americanos como foi a Unasul, vigente em seus mandatos anteriores e sepultada definitivamente na gestão de Jair Bolsonaro (PL).

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Lula não volta atrás

A polêmica em torno da Venezuela se tornou o principal assunto de uma entrevista coletiva que Lula concedeu a jornalistas brasileiros e estrangeiros ao final da reunião de cúpula, já na noite de terça. Na ocasião, Lula não mostrou arrependimento e tentou valorizar as críticas dos presidentes do Uruguai e do Chile como naturais.

“Ninguém é obrigado a concordar com ninguém”, disse Lula.

“Houve muito respeito com a participação do Maduro. Os que fizeram críticas as fizeram no limite da democracia”, avaliou o presidente brasileiro, que voltou a usar a palavra “narrativa” para classificar as críticas ao regime venezuelano.

“Todo mundo sabe o que eu falo e todo mundo sabe o que eu penso. Em política, toda vez que você quer destruir um adversário, a primeira coisa que você faz é construir uma narrativa negativa dele”, disse Lula.

Ele citou a expressão narrativa também para se referir ao ex-presidente venezuelano Hugo Chávez (já falecido), padrinho político do próprio Maduro, que foi vice no último mandato de Chávez e o substituiu na presidência.

Nova tentativa de união daqui a 4 meses

O incômodo de presidentes com o discurso de Lula sobre Maduro não impediu que todos os presentes aclamassem uma carta com um texto comum sobre a reunião de cúpula.

Entre os nove pontos estabelecidos no documento chamado “Consenso de Brasília” está o que fala sobre comprometimento dos países com a democracia e os direitos humanos.

Esse trecho diz que os países “reafirmaram a visão comum de que a América do Sul constitui uma região de paz e cooperação, baseada no diálogo e no respeito à diversidade dos nossos povos, comprometida com a democracia e os direitos humanos, o desenvolvimento sustentável e a justiça social, o Estado de direito e a estabilidade institucional, a defesa da soberania e a não interferência em assuntos internos”.

Outro resultado da cúpula foi o estabelecimento de um grupo de trabalho com os ministros das Relações Exteriores de todos os países presentes. Eles terão 120 dias para debater ideias sobre a integração do continente com o objetivo de levá-las para uma nova reunião de cúpula com os chefes de Estado. Nesse próximo encontro, a previsão é de que eles possam votar nessas ideias.

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