São Paulo (SP)* – Irmandade, nova série da Netflix produzida no Brasil, estreou nesta sexta (25/10/2019) na plataforma de streaming. O Metrópoles esteve em São Paulo para o lançamento da produção e conversou com Pedro Morelli, diretor geral, e os atores Lee Taylor, Pedro Wagner, Wesley Guimarães e Danilo Grangheia.
Seu Jorge protagoniza a história no papel de Edson, líder da facção criminosa fundada em presídio que empresta nome à trama. Ele fundou a organização ao lado de Carniça (Pedro Wagner) com objetivo de fazer frente às injustiças da cadeia. Mas a vida no cárcere ganha contornos inéditos quando a irmã de Edson, a advogada Cristina (Naruna Costa), se envolve com o grupo e acaba arrastando, sem querer, o caçula, Marcel (Guimarães).
“Cinema autoral só existe com Ancine”, diz diretor de Irmandade
“Cinema autoral só existe com Ancine”, diz diretor de Irmandade
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Jovem diretor da 02 Filmes, selo que tem como sócios seu pai, Paulo Morelli, Fernando Meirelles e Andrea Barata Ribeiro, produtora de Irmandade, Pedro enxerga na febre de séries algo parecido com o chamado cinema da retomada, em meados dos anos 1990.
“Começaram a ser feitas muitas séries de uns anos para cá. Isso é muito bacana e positivo. Porque todo mundo consegue filmar. Atores, diretores. A gente ganha musculatura na indústria quando entram esses players, como a Netflix, no Brasil”, acredita.
Morelli convidou dois colegas diretores para assinar alguns dos oito episódios da série: Aly Muritiba, conhecido pelos filmes Para Minha Amada Morta (2016) e Ferrugem (2018) e ex-agente carcerário, e Gustavo Bonafé, de O Doutrinador (2018) e Legalize Já: Amizade Nunca Morre (2017).
Elenco afinado
Para o jovem ator baiano Wesley Guimarães, revelado por Heitor Dhalia em Tungstênio (2018), trabalhar com autores de visões criativas diferentes foi instigante.
“Cada um tem a forma de pensar, mas eles trabalharam em uníssono. Pedro com sua calma, escuta aberta. Aly foi com quem mais me identifiquei, de trocar ideia mesmo. A praticidade do Bonafé. Séries fazem com que a gente consiga mergulhar mais na história, tenha mais tempo de trabalhar, passar mais tempo com o pessoal, viajar. Dá tempo de amar e odiar todo mundo”, brinca. “E isso está em cena”, completou Danilo Grangheia, que faz o investigador Andrade.
Outro destaque do elenco, Lee Taylor tem levado vida dupla na telinha: encarna o policial vilanesco Camilo na novela A Dona do Pedaço, da Globo, e o bandido Ivan em Irmandade. Antes, também viveu um agente da lei em Paraíso Perdido (2018), filme de Monique Gardenberg.
“Ele está preso por algo que fez, explodir caixas eletrônicos, e entende que é o momento de se aliar à facção”, explica Taylor. “Mas tem estratégia racional. É diferente dos outros presos, que têm conduta intuitiva”, aponta.
Carniça (Pedro Wagner) é um desses bandidões que agem à base do instinto. O ator pernambucano, membro do grupo de teatro recifense Magiluth, se diz cinéfilo e apontou o Willem Dafoe de Coração Selvagem (1990), de David Lynch, como uma das principais inspirações para o criminoso.
“Para mim, fazer esses personagens de ação é sempre uma tortura e ao mesmo tempo muito divertido”, analisa. “São muito distantes de mim, do que faço no teatro, do que me interessa e me atravessa. O exercício para mim é descobrir como posso fazer isso, achar identificação. Sempre fiz personagens mais violentos. Mas parece que tudo de certa maneira se encaminhou para esse”, diz Wagner, que fez um estuprador na minissérie Justiça (2016) e também atuou em Roubo da Taça (2016) e na versão seriada de Sob Pressão (2017).
Ancine: garantia de independência do artista
Morelli e elenco não poderiam deixar de comentar o momento político desfavorável ao financiamento público de cultura no Brasil. Wagner, por exemplo, diz que o pior dos cenários é ver a cena artística paralisada pelas incertezas políticas.
Aos 33 anos, mas já com certa experiência no cinema (Zoom, Entre Nós, codirigido por seu pai) e na TV (Contos do Edgar, Cidade dos Homens), Morelli vê com consternação o desmonte da Agência Nacional de Cinema (Ancine), cuja atuação perdeu força e independência após mudanças impostas pelo governo Bolsonaro.
“No momento, o mercado de cinema está paralisado. O cinema brasileiro faz mais de 100 filmes por ano. Espero que isso normalize”, diz. “O universo das séries vem multiplicando os talentos brasileiros. Mas a entrada desses players não substitui de forma alguma o mercado de cinema. Cinema autoral só existe quando se tem Ancine”, completa.
Morelli acredita que o financiamento público de arte garante a independência criativa e de expressão de quem produz cultura.
“Só assim um autor, um diretor, um roteirista vai conseguir escrever e falar o que quiser sem algum cliente ou canal pedindo alterações ou selecionando projetos a serem executados. Players são incríveis para a indústria. Porém, existe ali alguém pedindo, ‘faça essa série e não essa’. A independência do artista de cinema no Brasil só existe com Ancine funcionando”, reforça.
*O repórter viajou a convite da Netflix Brasil
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