Irmão mais velho é uma figura importante para os mais novos. Costuma abrir caminhos, serve de espelho e referência.
Em geral, é mais cobrado, mais maduro, supostamente mais responsável. O irmão mais velho carrega ônus e bônus pela sua posição.
Para os mais novos, é uma espécie de bússola, para quem a gente olha antes de decidir nossa direção, mesmo que seja uma trilha completamente diferente.
O irmão mais velho pode servir de inspiração como também de decepção e frustração. O mais novo olha o mais velho com um misto de respeito, admiração, contestação.
E, claro, como acontece com quase todos os irmãos, às vezes há briga entre eles, mas normalmente nada além de rusgas da convivência diária.
A cidade de São Paulo, uma espécie de “irmão mais velho” de Sorocaba, fez aniversário ontem. A capital paulista completou 467 anos de uma história rica, cheia de conquistas.
E de erros também. Fundado em 1554, o povoado de São Paulo de Piratininga surgiu em 25 de janeiro de 1554 com a construção de um colégio jesuíta por 12 padres, entre eles Manuel da Nóbrega e José de Anchieta.
O vilarejo estava encravado no alto de uma colina escarpada, entre os rios Anhangabaú e Tamanduateí. Tal colégio, que funcionava num barracão feito de taipa de pilão, tinha por finalidade a catequese dos índios que viviam na região do Planalto de Piratininga, separados do litoral pela Serra do Mar, chamada pelos índios de Serra de Paranapiacaba.
O nome São Paulo foi escolhido pois o dia da fundação do colégio — 25 de janeiro — é a mesma data em que a Igreja Católica celebra a conversão do apóstolo Paulo, conforme relatou o padre José de Anchieta em carta à Companhia de Jesus, ordem religiosa fundada em 1534 e liderada pelo basco Íñigo López de Loyola, conhecido posteriormente como Santo Inácio de Loyola.
Por muitas décadas, São Paulo permaneceu como vila pobre e isolada. Vivia das lavouras de subsistência. Afinal, as atenções de Portugal se voltavam para as capitanias no litoral.
Assim, São Paulo foi, por muito tempo, a única vila no interior do Brasil. Esse isolamento se dava principalmente porque era dificílimo subir a pé a Serra do Mar, vindo da Vila de Santos ou da Vila de São Vicente para o Planalto de Piratininga. Subida esta que era feita pelo Caminho do Padre José de Anchieta.
Mem de Sá, quando de sua visita à Capitania de São Vicente, proibira o uso do Caminho do Piraiquê (hoje Piaçaguera), devido aos frequentes ataques de índios.
Mas em 22 de março de 1681, o Marquês de Cascais, donatário da Capitania de São Vicente, transferiu a capital para a Vila de São Paulo.
Por ter sido uma região pobre da colônia portuguesa, os paulistas não podiam comprar escravos africanos. Daí nasceu a atividade dos bandeirantes, que se dispersaram pelo interior do Brasil à caça de índios. Eles também iam em busca de riquezas, ouro e diamantes.
Na rota para o Mato Grosso e Minas Gerais, os bandeirantes passavam pela região que viria a ser Sorocaba.
Em 1589, o português Afonso Sardinha esteve no morro de Araçoiaba à procura de ouro, mas encontrou somente minério de ferro.
No local, Sardinha construiu a primeira casa da região, que deu origem à fundação da vila de Nossa Senhora da Ponte de Monte Serrat onde, no ano seguinte, por ordem do então governador-geral do Brasil, Dom Francisco de Sousa, foi inaugurado o pelourinho (símbolo do poder real).
Após o retorno de dom Francisco à corte, o capitão Baltasar Fernandes instalou-se na região em 1654, nas terras que recebeu do rei de Portugal, com família e escravos indígenas vindos de Santana de Parnaíba. Fundou então, a 15 de agosto de 1654, um povoado com o nome de Sorocaba.
Ou seja, 100 anos depois de São Paulo, nasceu o ‘irmão mais novo’. Eles cresceram juntos, cada um à sua maneira, com características e temperamentos próprios. Cada um a seu modo, ambos se ajudaram — e se ajudam até hoje.
Que o aniversário do “irmão mais velho” sirva de inspiração para Sorocaba. Mas que não repita os erros cometidos por São Paulo ao longo da história.
Que Sorocaba siga sua caminhada mirando os bons exemplos da capital. Que busque a modernidade, mas sem abrir mão de sua qualidade de vida. Onde seja possível seguir ouvindo o canto dos pássaros, em vez de apenas barulho de máquinas e britadeiras.
Que seja possível ver o pôr do sol, em vez da permanente poluição. Que Sorocaba siga ‘mais saudável’ do que o irmão mais velho, respirando ar mais puro.
Pode seguir os bons exemplos, claro, como efervescência cultural, grandes eventos, diversidade e tolerância. E que não desvirtue, como o primogênito fez, na questão social, com um grau de miséria que choca até os mais insensíveis.
O irmão mais novo não pode deixar que absurdos vistos na capital, como a Cracolândia e a violência urbana, façam parte de seu cotidiano.
O lema de São Paulo, presente em seu brasão oficial, é “Non ducor, duco”, expressão em latim que significa “Não sou conduzido, conduzo”. Que São Paulo nos conduza por um bom caminho.
E que Sorocaba ajude esse “irmão mais velho”, seguindo os bons exemplos e não repetindo os seus erros.
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