A reunião da Agência Nacional de Vigilância Sanitária que decidiu rejeitar o pedido de 10 estados para importar a vacina russa contra a Covid-19 Sputnik V durou cerca de cinco horas.
Na ocasião, tanto a equipe técnica quanto os diretores do órgão regulador elencaram uma série de ponderações para que o imunizante desenvolvido pelo Instituto Gamaleya não recebesse o aval da agência regulatória, mesmo que em caráter extraordinário, para ser aplicado na população brasileira.
O principal argumento foi a falta de informações suficientes para garantir a segurança e a eficácia da vacina. De acordo com a área técnica, a partir das informações que foram apresentadas até o momento, o imunizante russo não provou que seus benefícios são maiores do que os riscos.
A tecnologia da Sputnik V, baseada em adenovírus vetor, seria o principal impedimento. Apesar deste tipo de imunizante ser bastante comum, a Anvisa encontrou indícios, comprovados pela fabricante, que há adenovírus capazes de se reproduzir no organismo humano, o que vai contra todas as resoluções internacionais.
A equipe técnica afirmou que sem estudos aprofundados sobre isso seria impossível garantir que a vacina não produziria consequências adversas sérias como, por exemplo, o desenvolvimento de outras doenças nas pessoas que tomarem a vacina, problemas reprodutivos para a população vacinada ou reações adversas como coágulos sanguíneos, por exemplo.
“Esta é uma não-conformidade grave. Está em desacordo com o desenvolvimento de vacinas de vetor viral e com um perfil de qualidade esperado. Essa possibilidade de permitir que vírus replicantes estejam presentes não é justificada, e não é aceita tanto quando comparamos com recomendações internacionais, como quando comparamos com outras vacinas com a mesma tecnologia”, explicou Gustavo Mendes, gerente geral de medicamentos e produtos biológicos.
Outro ponto considerado crucial foi a dificuldade da equipe técnica de atestar que o imunizante a ser importado teria a mesma qualidade da fórmula usada nos ensaios clínicos. A missão da Anvisa que esteve na Rússia encontrou dificuldades para visitar as fábricas da Sputnik V, não conseguiu entrar no Instituto Gamaleya, e os técnicos consideraram impossível garantir que a fórmula usada nos ensaios clínicos seria a mesma a ser importada para o Brasil.
Ana Carolina Marino, gerente geral de inspeção e fiscalização sanitária, explicou que não foi possível avaliar as instalações, discutir os parâmetros de produção do imunizante com o fabricante, verificar se as vacinas são fabricadas de forma consistente e controlada, e que os riscos de produção estão minimizados.
“Consideramos todas as informações disponíveis à Anvisa, e nosso parecer é que, nesse momento, o risco inerente de fabricação não pode ser superado e não recomendamos a importação”, disse.
O órgão também não conseguiu obter informações sobre a confiabilidade do imunizante com outras agências reguladoras que já liberaram ou também estão analisando a Sputnik V. Em alguns casos, como na agência mexicana, há acordos de confidencialidade que impedem a troca de dados.
A agência argentina informou o Brasil sobre uma dificuldade em diferenciar a primeira da segunda dose (são fórmulas diferentes), uma vez que o rótulo das vacinas está em russo — a confusão causou uma série de erros na aplicação, o que pode influenciar na eficácia do produto. A probabilidade alta de efeitos adversos também despertou preocupação. A equipe técnica da agência citou falhas no desenho do estudo clínico de fase 3 feito na Rússia para detecção de problemas pós-vacina.
Mesmo com as poucas informações disponibilizadas pelos autores do pedido, a Anvisa fez uma busca ativa por documentos que pudessem facilitar a análise dos técnicos. “Buscamos suprir a falta de informações, mas não obtivemos sucesso em nossas tentativas”, afirmou o diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres.
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