Mulheres são produtoras e maiores consumidoras de true crime no Brasil

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Pouco visitado no passado, o true crime virou febre mundial e conquistou o público feminino. Seja produzindo obras com a temática ou formando audiência, as mulheres têm desempenhado um papel importante na popularização do gênero em podcasts, livros e até séries de TV.

O Modus Operandi, do catálogo da Globoplay, por exemplo, foi o podcast mais ouvido de 2020, na categoria crime e suspense. Além de conduzido por duas apresentadoras — Carol Moreira e Mabê Bonafé — o  programa também tem mais de 70% de sua audiência composta por mulheres, seguindo uma tendência já observada pelas plataformas de streaming.

No Spotify, onde o Modus Operandi também é disponibilizado, o interesse das mulheres em podcasts de crimes reais cresceu 16% entre 2018 e 2019.

“As pessoas se interessam por  true crime por diversos motivos, só que o que a gente identifica bastante é a curiosidade de entender como aquela história se desenhou, como é que o crime foi praticado, quem são as pessoas por trás, tanto as vítimas como quem comete os crimes. Em relação às mulheres, tem o fator proteção. Muitas consomem esse tipo de conteúdo para entender como evitar situações que possam colocá-las em perigo”, avalia Mabê. 


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Com mais de 100 episódios publicados, o Modus Operandi explora casos conhecidos na mídia brasileira, como o de Suzane von Richthofen, até outros mundialmente famosos como o assassinato de Maurizio, herdeiro da Gucci, intercalados com episódios sobre curiosidades. Um exemplo é o episódio Exodus: a cruel terapia de conversão LGBTQIAP+, que se aprofunda na investigação do grupo de religiosos responsáveis por promover, durante décadas, terapia de reorientação sexual.

Mabê e Carol buscam romper com narrativas que validam argumentos do tipo “ela usava uma roupa curta demais” para culpabilizar as vítimas. Segundo a dupla de podcasters, os feedbacks têm sido positivos e vêm principalmente de mulheres. “Recebemos muitas mensagens delas  falando que aprenderam algo para se proteger melhor e até que se identificaram com acontecimentos estranhos em suas vidas”, ressalta Carol.

Pesquisa realizada pela Civic Science, empresa de inteligência estadunidense, corrobora a tendência observada no Brasil, apontando que pelo menos 26% das mulheres americanas consomem podcasts de true crime, mais que o dobro de homens.

Outro estudo produzido no Departamento de Psicologia da Universidade de Ilinois mostra que o fenômeno também acontece na literatura e oferece explicações para isso. Uma das possibilidade é que as mulheres estejam interessadas em compreender as motivações dos crimes e táticas para escapar deles, obtendo algum tipo de controle sob a violência a que são alvo.

Filão literário

Após passar por revistas de celebridade e escrever para o público juvenil, a jornalista Patricia Hargreaves aceitou o desafio de revisitar a história do cirurgião Farah Jorge Farah, condenado por matar e esquartejar sua paciente e ex-amante, Maria do Carmo Alves. Da apuração, nasceu o livro o Médico que Virou Monstro, da Máquina Livros, que assim como outras histórias emblemáticas, teve seus direitos adquiridos por uma produtora e deve virar série, nos moldes de Elize Matsunaga, da Netflix.

Apesar de uma negociação desse tipo poder alçar Patrícia ao estrelato, a autora diz ter sido atraída ao filão editorial por outros motivos. “O que mais me motiva a escrever sobre esse assunto é que o mundo tem que aprender com casos como esse, entender onde a polícia e a Justiça erraram. Só assim vamos evoluir como civilização.  O caso do Jorge Farah e da Maria do Carmo era uma tragédia anunciada, podia não ter acontecido”, diz.

Ela destaca a importância de discutir os crimes de feminicídio. “No Brasil, durante o Império, era permitido o marido matar a mulher por causa de uma traição, por exemplo. Essa tese foi usada pela defesa de Doca Street no julgamento do assassinato de Ângela Diniz, nos anos 1970:  homicídio passional praticado em legítima defesa da honra com excesso culposo. Hoje, o Código Penal não permite isso, mas muitas vezes a visão da sociedade, sim. Então se a gente não olha pro passado, a gente vai seguir cometendo os mesmos erros”, opina Patrícia. 

Essa visão é compartilhada por Paola Serra, autora de O Caso Henry: Morte Anunciada, também da Máquina Livros. Ela apura a história desde março de 2021, quando o falecimento do menino Henry Borel, de 4 anos, se tornou suspeita. As investigações da polícia, narradas com detalhe por ela na obra, levaram ao indiciamento do ex-casal Monique Medeiros e Jairo Souza dos Santos Júnior, o Dr. Jairinho.

Leniel Borel, pai do menino Henry morto em 8 de março
Leniel Borel, pai do menino Henry morto em 8 de março. A ex-esposa dele, Monique, e o ex-namorado dela, o vereador Jairinho, são acusados pela morte

“A Justiça vai decidir qual a responsabilidade deles. Mas é importante destacar que houve a morte de uma criança saudável, em circunstâncias no mínimo suspeitas. A gente precisa levantar esse debate sobre violência doméstica pra evitar novas tragédias. e as obras true crime permitem isso. Aconteceu num bairro de classe média alta, com um casal jovem e bonito e envolve um político eleito cinco vezes. Mas a tortura de crianças e adolescentes dentro de casa acontece em todas as classes sociais”, pontua Paola. 

Desde que o livro foi publicado, no final do ano passado, a maioria dos feedbacks que recebe também são de mulheres. “Existe uma curiosidade sobre a figura da Monique justamente porque ela representa essa mulher comum, considerada por familiares como uma mãe carinhosa, e que agora pode ser condenada por participar ou ter sido omissiva”, avalia.

Desafios

Além do desafio de manter uma linguagem imparcial, uma vez que o Caso Henry é um livro-reportagem e o julgamento ainda está em curso, Paola Serra destaca outros obstáculos que as mulheres costumam se deparar ao adentrar o universo true crime. Apesar de ter iniciado a carreira escrevendo sobre crimes, ela diz que ainda hoje enfrenta olhares tortos de colega. “Por ser mulher, por parecer ‘patricinha’, algumas pessoas acham que eu deveria estar falando de coisas mais leves”, pondera,

Ela acredita, no entanto, que o preconceito está cada vez menor. “Por ser mulher, a gente tem um desafio a mais. Mas o trabalho fala por si só e com ele a gente ganha a confiança das nossas fontes, do leitor, e mostra para o que veio”. 

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