Uma das coisas mais difíceis de conseguir realizar no mundo gastronômico é repetir o sucesso de uma experiência ímpar. Em meus 20 anos de cobertura desse universo tão saboroso, pude observar algumas tentativas de se reproduzir negócios originalmente incríveis.
Lembro-me bem, por exemplo, de como era prazeroso visitar o restaurante francês que funcionava na casa da chef Alice Mesquita, no Lago Norte. Por motivos de conveniência dos vizinhos, ele precisou se mudar dali para a QI 17 do Lago Sul. Embora estivesse em endereço também nobre e servindo uma boa comida, parecia faltar algo. O mesmo aconteceu com O Convento, outro lugar que eu adorava ir, na residencial da QI 9 do Lago Sul. Ao ser obrigado a se mudar para a Casa D’Itália, na 208 Sul, alguma coisa se perdeu pelo caminho.
Foto: Luciana Barbo
0
Senti algo parecido ao visitar a segunda unidade do Acervo Café no shopping CasaPark. Acostumada a ir ao endereço genuíno, no Guará, percebi que a entrega neste segundo ponto se mostrou aquém daquela que vejo na iniciativa original. Vários elementos do conceito estão ali, como móveis de design misturados a peças vintage garimpadas pela internet ou lojas de segunda mão. O teto baixo e a luz mais intimista também estão lá, assim como o ambiente que parece inacabado. Porém, parece tudo meio solto, frio, sem aquele aconchego singelo e gostoso que sinto ao adentrar no primeiro andar do prédio localizado no setor de oficinas do Guará, a alguns poucos quilômetros dali.
Para falar a verdade, lá no fundo, eu já imaginava que isso pudesse acontecer quando dei a notícia da expansão em primeira mão, em setembro de 2021. Sei que muitos vão discordar, dizendo que os negócios precisam evoluir, expandir. Concordo que precisam mesmo. Mas me deixem aqui com a lembrança da primeira vez em que estive por lá e me senti acolhida pela atmosfera que me lembrou a casa da minha avó. Foi por essa memória que voltei tantas vezes e pela qual ainda irei tantas outras.
Quero deixar claro que não estou falando mal do lugar. Apenas pontuando a diferença na experiência. Provavelmente, alguém que não conheça a versão original, sinta-se muito diferente de mim. E está tudo bem.
Afora esta questão de percepção, devo ressaltar que o Acervo continua sendo uma das melhores cafeterias da cidade. O trabalho do Paulo Lins em garimpar pelo país os melhores cafés e fazer a própria torra são diferenciais da casa.
Os grãos atuais são dos produtores Reginaldo Costalonga (Vargem Alta – ES) com notas de sensoriais de caramelo, pêssego e flor de laranjeira; de Valéria Assumpção (Alto Jequitibá – Minas Gerais), que cheira a baunilha, chá preto, ameixa, mel; e da Busato CD (Marechal Floriano – ES) com aromas de pêssego, mirtilo, rapadura, flores.
Eles dão vida aos espressos, cappuccinos, assim como ao espresso tônica (R$ 17) e ao affogato, servido com sorvete de mascarpone da Saborella (R$ 27). O cold brew, bebida extraída a frio também tem seu lugar, seja pura, com tônica, leite, suco de laranja ou água de coco (de R$ 15 a R$ 18).
Para comer, as receitas criadas pela sócia Abigail também têm o seu lugar na minha memória afetiva mais recente. A Coffeecake (R$ 23) já é um clássico entre os chocólatras da cidade. Mas eu tenho gostado mais do bolo de tâmara, coberto com ganache de chocolate 70% e um toque de café ( R$ 26). Fui nele e no bolinho vegano de abacate, com cacau e mousse do mesmo ingrediente (R$ 23). Este último me deixou intrigada e vou comer novamente para ter uma opinião mais certa sobre ele.
Gostaria de ter provado o bolo sazonal com chocolate, pistache, pimenta da Jamaica e creme de mascarpone (R$ 28), mas não estava disponível. Já a banoffee deixou de ser vendida nesta unidade por uma questão logística. Preciso chamar a atenção para este ponto. Num menu tão enxuto, a falta de itens pode fazer o cliente sair frustrado.
Pedi, então, o pão de fermentação natural com polpa fresca de tomate italiano, manjericão e azeite (R$ 23). O ponto alto dessa vez foram a focaccia, também com tomate, fofinha, deliciosa; e o avocado toast, com pão coberto por abacate, ricota, amêndoas e passas (R$ 36). As tortas de frango (R$ 26) e de queijo pecorino, cream cheese e amêndoa defumada (R$ 29) nunca decepcionaram, então podem apostar.
Vale dizer que, mais do que os cafés, a casa também oferece algumas opções de vinhos naturais em taça (entre R$ 24 e R$ 55) e drinques como o Negroni (R$ 36), que eu gosto muito, e Dry Martini (R$ 45).
Em resumo, vou voltar a esta unidade para ver se consigo assimilar melhor a proposta diferenciada. Mas o meu lugar mesmo é o cantinho original, no Guará, com carinha da casa de vó e banoffee para acalmar a alma.
Serviço
Acervo Café CasaPark
Shopping CasaPark, no mezanino da Livraria da Travessa
Funciona de segunda a sábado, das 10h às 22h; domingo, das 12h às 20h.
No Instagram: @acervocafe
Loja virtual: www.acervocafe.com.br
Para mais dicas de gastronomia, siga @lucianabarbo no Instagram.
O post Acervo Café: segunda unidade entrega experiência diferente da original apareceu primeiro em Metrópoles.