Depois de mais de dois anos enfrentando uma crise sem precedentes, o setor de bares e restaurantes começa a vislumbrar uma recuperação gradual com a volta dos consumidores. Mas, agora, temem pela alta da inflação
O setor de bares e restaurantes se anima com o desenho de uma possível retomada econômica a partir deste mês. Após dois anos sobrevivendo com a crise sanitária do novo coronavírus, o avanço da vacinação e o recuo das medidas restritivas são recebidos como um respiro pelos empresários. Para o setor, a partir deste mês, o cenário será marcado pela retomada. Com 25 anos de atuação, o restaurante de comida mexicana El Paso é um dos que projeta crescimento, apesar das dificuldades vivenciadas na crise sanitária, como destaca o gerente Klemilton de Brito.
“Esperamos a volta dos clientes pouco a pouco, pois, de acordo com o ritmo da vacinação, fomos percebendo uma boa recuperação (das vendas). Mas a queda, em relação ao que vendíamos, foi de 30% a 40%”, detalha o também gerente Varlan de Melo Lima. O El Passo acredita que o Dia dos Namorados (12 de junho) e o Día de los Muertos (2 de novembro) trarão um número positivo no índice de vendas. “São duas datas que costumam ter muito movimento”, afirma Varlan.
Presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel-DF), Beto Pinheiro reforça a análise otimista do empresário. “Temos um retorno de funcionários de diversas empresas para o trabalho presencial e isso está sendo positivo para o setor de bares e restaurantes. Além disso, a pandemia está mais controlada, conforme a previsão que tínhamos feito quando a ômicron chegou e causou um pico entre janeiro e fevereiro. Percebemos a diminuição da taxa de transmissão e do número de mortes, o que desafoga o sistema de saúde. No meu entendimento, o que precisamos é fazer a economia girar, porque as empresas estão em uma situação de endividamento muito grande. As que pegaram empréstimos, começaram a pagar suas parcelas e precisam desse aquecimento econômico”, alerta Beto.
Proprietário do restaurante de comida chinesa Long, Li Peng pontua que a expectativa é que as vendas voltem ao normal. “Estamos abertos há 17 anos. Mas as vendas caíram muito na pandemia, e em 2020 ficamos três meses fechados. Além disso, o preço dos alimentos subiu muito, como óleo e carne”, ressalta. Embora sem um recorte específico do Distrito Federal, a Abrasel divulgou uma pesquisa de nível nacional, mas que reflete a situação do DF. De acordo com ela, desde a chegada da pandemia, o percentual de empresários que fechou o mês de janeiro de 2022 com saldo positivo (34%) foi superior aos que tiveram prejuízo (31%). Outros 31% fecharam as contas em equilíbrio.
Desafios
O setor, contudo, também passa por percalços. O carnaval não trouxe o lucro esperado e fechou os quatro dias de folia no “zero a zero”. As informações foram dadas pelo presidente do sindicato patronal de hotéis, restaurantes, bares e similares de Brasília (Sindhobar), Jael Silva. “Como o carnaval estava proibido, o movimento foi muito fraco, alguns não registraram aumento das vendas e outros tiveram queda de até 10%. Mas, gradativamente, devemos voltar a normalidade, e com isso as pessoas devem rapidamente voltar a frequentar os bares e restaurantes. Também esperamos que a inflação não dispare para não afetar a economia nem os produtos. Outro ponto que nos motiva são os festivais gastronômicos da cidade, que devem aquecer o mercado”, avalia.
A perspectiva de melhoria do comércio também anima o Sindicato dos Empregados no Comércio Hoteleiro, Restaurantes, Bares e Similares do DF (Sechosc). De acordo com Orlando Cândido Gomes, presidente do Sechosc, a expectativa é de que novas contratações. “O mercado está indo a todo vapor e está melhorando bastante, e isso alegra o nosso setor. Durante a pandemia sofremos muito com as demissões, mas agora, com a abertura de novos empreendimentos, os empresários começam a recontratar porque eles sabem que sem o funcionário eles não vivem. Mas ainda somos uma categoria muito sacrificada”, destaca.
Problemas
O restaurante Mayer Sabores do Brasil, que atua há 13 anos no mercado, também teve queda nas vendas, com a chegada do novo coronavírus, de acordo com a proprietária Keli Mayer. “Foi praticamente 50% de queda nas vendas, e, mesmo com o retorno das atividades, não voltamos a vender o mesmo que antes. Durante a pandemia, como já estava construindo desde 2018, abri outro Mayer e o Café das Orquídeas, que também sofrem com a pandemia. O grande problema é que as vendas estão abaixo da pré-pandemia, e os gastos com a empresa, como funcionários, alimentos, produtos de limpeza e descartáveis, estão cada vez mais caros, isso é um problema que dificulta muito a nossa realidade. E isso vai além do vírus, porque agora se refere a crise econômica mesmo, as famílias não estão saindo como antes, estão economizando, porque não possuem o mesmo valor para gastar. Se iam para o restaurante todo fim de semana, agora visitam duas ou uma vez por mês”, salienta.
Economista e coordenador do curso de economia da Universidade Católica de Brasília (UCB), Matheus Silva de Paiva aponta que o momento é de “inflação global extremamente alta”. “Em especial o preço do combustível, agora ocasionado com a guerra da Rússia com a Ucrânia, e como o transporte é um insumo básico e tudo precisa ser transportado, isso afeta diversos outros produtos. Sem falar que casas noturnas, shows, músicas e restaurantes ficaram muito tempo fechados, então acumularam dívidas. Uma sugestão aos restaurantes é tentar utilizar do marketing mais agressivo para chamar clientes”, sugere.
O professor orienta as empresas a irem para as redes sociais, como Instagram e Tik Tok. “Mexer no preço é algo quase impossível de se fazer devido a alta de preços, então, o diferencial será o atendimento (inclusive on-line) ao cliente e a boa publicidade. E quando esse consumidor chegar na casa, tratá-lo como um rei. Esse atendimento diferenciado é superimportante, para garantir a fidelidade do cliente”, ressalta.
Festivais
Alguns restaurantes enfrentaram um desafio dobrado ao terem que lidar com a abertura dos seus negócios no meio da pandemia. É o caso do Ouriço, que iniciou as atividades em agosto de 2020. “Como abrimos na pandemia, não temos com o quê comparar, mas, de 2020 para cá, as vendas têm gradualmente melhorado, subindo pouco a pouco os números. Outra expectativa nossa de melhoria se refere ao Brasília Restaurant Week, que costuma deixar a casa cheia e trazer um movimento muito bom”, salienta Benildo Sousa, maitre do restaurante.
Sócio-proprietário do Contê, Oda Piacini observa que a Casa também espera por um movimento positivo no Restaurant Week. “Assumimos a gestão do Contê em março de 2020 e ficamos sem poder abrir. Nos momentos que tem lockdown, demora uns dois meses para voltar a termos uma retomada, pois o comércio fica de novo desaquecido e as pessoas ficam com medo de retomar as atividades. Mas estamos confiantes com este ano. Além disso, o primeiro fim de semana do Restaurant Week já deixou a casa cheia”, se alegra.
Especialista em finanças e economia da saúde da Estácio Brasília, Cássia Chagas aponta que os empresários podem adotar a diversificação de produtos e serviços. “Ampliar a gama de clientes atendidos pelos estabelecimentos, gerando margem de lucro complementar às atividades já desempenhadas (é uma alternativa)”, avalia. Cássia também pontua que o equilíbrio das contas, “e da estrutura de capital, bem como um gerenciamento eficiente de estoque, permite o suprimento de acordo com as necessidades, evitando medidas emergenciais e trazendo melhor capacidade de negociação junto aos fornecedores”, finaliza.
Frases
“O que precisamos é fazer a economia girar, porque as empresas estão em uma situação de endividamento muito grande. As que pegaram empréstimos, começaram a pagar suas parcelas e precisam desse aquecimento econômico”
Beto Pinheiro, presidente Abrasel-DF”Gradativamente, devemos voltar a normalidade, e com isso as pessoas devem rapidamente voltar a frequentar os bares e restaurantes. Também esperamos que a inflação não dispare para não afetar a economia nem os produtos”
Jael Silva, presidente do Sindhobar