A fome não espera

0
346

O isolamento social e a quarentena forçada em vigor em praticamente todo o País são considerados mecanismos eficientes para diminuir a velocidade de propagação do novo coronavírus, uma epidemia que até esta quarta-feira (15) já tinha matado aproximadamente 2 mil brasileiros e infectado milhares de pessoas.

Mas o isolamento afeta primeiramente a vida dos cidadãos mais humildes que não têm reservas financeiras para se manter algum tempo sem trabalho.

Com a quarentena, estão sem trabalhar os ambulantes, funcionários de pequenos comércios, artesãos e informais, entre tantos outros, inclusive as pessoas que começam a ser demitidas por conta da crise.

Para levar algum tipo de assistência a essas pessoas que mais precisam, foram criados diversos programas de auxílio pelos governos federal, estaduais e municipais.

O grande problema encontrado em todos os níveis é como fazer a distribuição desses auxílios.

É a maneira de fazer chegar a ajuda a quem realmente precisa, evitando fraudes e os sempre presentes aproveitadores.

O programa de auxílio mais robusto é o do governo federal, já aprovado pelo Congresso, que vai distribuir às pessoas cadastradas um auxílio emergencial de R$ 600 por um período de três meses.

Só esse programa vai custar aos cofres da União R$ 98 bilhões. Os problemas começam com a burocracia e as dificuldades encontradas para fazer chegar esse dinheiro lá na ponta, na mão da pessoa necessitada.

O programa requer atualização do CPF, cadastros, criação de contas de poupança digitais entre outras providências. O certo é que grande parte das pessoas necessitadas têm enorme dificuldade em cumprir esse ritual burocrático e precisam urgentemente do auxílio.

O sorveteiro que ficou sem trabalho há um mês não tem a menor intimidade com internet, cadastros eletrônicos e mal consegue retirar o benefício em um caixa eletrônico sem ajuda.

O fato é que depois de todo esse tempo de espera, o dinheiro está sendo depositado em contas, mas só começa a chegar à mão dos necessitados no dia 27 de abril, para quem nasceu nos meses de janeiro e fevereiro.

Mas não é só esse auxílio emergencial que encontra dificuldades em atender à população mais humilde. Com a interrupção das aulas, criou-se um grande problema: a distribuição da merenda escolar às crianças carentes.

Como se sabe, para muitos alunos da rede pública, a merenda é a principal refeição do dia. O problema é sério e fez com que o Ministério Público do Estado de São Paulo abrisse na última terça-feira (14) investigação para saber como a merenda escolar será distribuída para mais de 60 mil alunos da rede municipal de Sorocaba durante a quarentena.

A iniciativa do MP baseia-se em lei federal que estabelece que a alimentação escolar é direito dos alunos da educação básica pública e dever do Estado.

Também foram considerados os sérios prejuízos que as famílias de baixa renda tiveram como consequência da pandemia da Covid-19, principalmente crianças de baixa renda que dependem da merenda para sua subsistência.

O governo estadual parece ter saído na frente e criou um programa de distribuição de R$ 55 por aluno carente da rede estadual.

O valor será dobrado nos dois primeiros meses para os mais carentes. A parcela referente ao mês de abril já está disponível desde o dia 8.

Ao todo, o programa deve atender a 732 mil estudantes da rede; e só em Sorocaba perto de 8 mil alunos têm acesso a esse auxílio.

O problema mais uma vez é que o pagamento aos beneficiários é feito por meio de um aplicativo, que pode ser usado em qualquer smartphone e, como se sabe, nem todos os alunos carentes têm acesso a esse tipo de aparelho.

Em Sorocaba, várias empresas, principalmente supermercados e do ramo de alimentos, doaram uma grande quantidade de cestas básicas para que a Prefeitura possa fazer a distribuição para as famílias mais necessitadas.

Ocorreram no início algumas falhas de comunicação e muitas pessoas interessadas em receber os alimentos dirigiram-se aos Centros de Referência de Assistência Social (Cras) dos bairros para retirar o auxílio.

A ideia da administração municipal não era essa, pois queria justamente evitar a aglomeração de pessoas em locais públicos, situação propícia para a contaminação pelo coronavírus.

A estratégia adotada foi mais uma vez baseada na tecnologia, com os interessados preenchendo um cadastro na internet.

É um método prático e rápido de inscrição que pode chegar rapidamente para análise das equipes da Assistência Social, mas pressupõe que todos tenham acesso à internet.

Seguramente, boa parte das famílias necessitadas não tem um computador e menos ainda acesso a uma rede de internet.

Em casos extremos, famílias moram em habitações improvisadas sem saneamento e energia elétrica.

É preciso, em muitos casos, um mecanismo mais simples. Um gargalo que precisa ser resolvido o quanto antes, pois a fome não espera.

O post A fome não espera apareceu primeiro em Jornal Cruzeiro do Sul.

Artigo anteriorUnião Europeia tenta organizar saída do confinamento
Próximo artigoDinamarca retoma aulas de forma gradual