A historiadora e antropóloga Lilia Schwarcz, em entrevista ao Roda Viva nesta segunda-feira (7/9), avaliou que o presidente da República, Jair Bolsonaro, tem “sequestrado” a pauta democrática no país e que as ações do chefe do Executivo federal corroem as instituições do Estado, por dentro.
“Jair Bolsonaro não precisa de um golpe, porque ele está corroendo nossas instituições por dentro. Ele é o golpe. Muito interessante os brasileiros terem acreditado numa miríade de nova política, quanto tínhamos na frente uma velhíssima política”, observou.
Ela citou como exemplo desse sequestro de pauta a escolha do presidente da Fundação Palmares, Sergio Camargo. “O que é colocar na Fundação Palmares um presidente que quer acabar com a memória dos negros?”, questionou. “As populações negras no Brasil têm dupla morte. A morte física e a morte da memória. O governo Bolsonaro está sequestrando as pautas democráticas. Não só os nossos símbolos, como o verde e amarelo, mas sequestrando as pautas, produzindo uma guerra cultural.”
Independência
Ao falar do processo histórico do país, ela classificou a Independência do Brasil como “um história mal contada”, que, em vez de um processo revolucionário. foi mais um “golpe das elites” para manter o sistema escravocrata. “Nossa independência não foi revolucionária, tampouco romântica. Foi um golpe das elites em torno do imperador, que garantiria não só o não desmembramento do Estado, mas, sobretudo, o sistema escravocrata”, analisou a historiadora.
“Já na época se dizia que a independência criou um Estado, mas não criou uma nação. Isso porque, naquele momento, não existia exatamente o Brasil. O Brasil era uma referência às províncias portuguesas na América do Sul. A tentativa do processo foi criar uma historia europeia, masculina, claro, uma história colonial e imperial, como se isso fosse um destino”, disse Lilia.
Para o contexto da época, o Brasil se colocou como uma anomalia na América Latina, como única monarquia, cercada de repúblicas. “Acho que esse é um processo dividido, uma história mal contada. Seria preciso contar essa história por outros lados, nossa independência parece um processo sem povo, ou seja, sem reação. Nossa independência foi uma anomalia dentro das Américas, porque criou uma monarquia cercada de repúblicas. Acho que é o momento de pensarmos o que vamos comemorar agora e também em 2022. Que história nós vamos querer contar?”, questionou.
“Nostalgia imaginária”
Ela apontou a “nostalgia imaginária” do governo brasileiro de que o país funcionava durante os governos militares, um passado que não existiu. “Isso porque o primeiro governo militar foi um fracasso, tanto Deodoro [da Fonseca] como Floriano [Peixoto] governaram em estado de sítio. Nossa ditadura [que teve início na década de 1960] entregou um estado falido, uma inflação terrível”, afirmou.
“Estamos falando de um governo que faz uma mística da ditadura, chama o golpe de democrático, como se isso existisse, e chama por um passado que nunca existiu. Esse passado é criado por Jair Bolsonaro”, acrescentou.
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André Borges/ Especial para o Metrópoles
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