Rio de Janeiro – Os primeiros quatro meses do ano foram marcados por chuvas com rastro de tragédias no Rio de Janeiro, causando deslizamentos de terra, enchentes e vítimas fatais. Especialistas ouvidos pelo Metrópoles alertam que, com o retorno da frente fria, o estado pode registrar novos temporais.
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Um dos fatores que explicam essas chuvas é o fenômeno La Niña, que ocorre todos os anos a partir de novembro, se intensifica no verão e acaba no início do outono, mas nesse ano pode ficar até o inverno.
Ainda é cedo para dizer o quão intensa serão as próximas chuvas, quando e quais locais terão novas enchentes, mas segundo Valdo Marques, meteorologista e professor titular da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF), a expectativa é de que o fenômeno continue durante o outono:
“É provável que ocorra outros temporais durante o outono do Rio de Janeiro, mas não tem como afirmar a intensidade deles. Como o La Niña está mais forte no Sul, pode ser que venha mais fraca para o Sudeste ou mais forte, mas não temos como afirmar por agora, até porque a frente fria pode mudar a trajetória e ir para o oceano, por exemplo”, explicou o professor.
Nesta sexta-feira (15/4), o Rio de Janeiro registrou o dia com a menor temperatura do ano, cerca de 18,8º C no começo da manhã.
Ocupações irregulares preocupam especialistas
Há dois meses, Petrópolis, região serrana do Rio, foi atingida por temporal que deixou 234 vítimas fatais, em 15 de fevereiro. Outras sete pessoas perderam a vida no município, também decorrência das chuvas, no dia 20 de março.
Nova Iguaçu, Belford Roxo, Angra dos Reis e Paraty foram outras regiões afetadas com as últimas chuvas no início de abril. De acordo com a meteorologista Marlene Leal, do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), as últimas chuvas foram acima do esperado para o mês:
“Ainda pode chover forte, mas vai depender dos sistemas frontais que passarão por aqui. As chuvas fortes dos últimos dias estão relacionadas a um sistema frontal forte no dia 20, que rompeu o bloqueio da massa de ar quente e seco que predominava por aqui desde fevereiro, durante 23 e 24 dias sem chuva e com muito calor. O fim de semana entre 1º e 2 de abril foi muito forte, principalmente nas áreas litorâneas, como Costa Verde até Saquarema, com volumes acima do esperado”, explicou à reportagem.
Para Estael Sias, meteorologista da MetSul, outro ponto de atenção dessas próximas chuvas é a região litorânea: “A tendência em média é do padrão mais seco do inverno se instalar, porém no leste, no litoral da região, ainda poderá chover com um pouco mais de frequência”.
A meteorologista afirma que o problema vai além do volume de chuvas: “Existe o vetor social, áreas que sempre tiveram bastante chuva e que estão sendo ocupadas de forma inadequada. Isso acaba sendo um fator agravante do risco”, diz Estael.
Chuvas e alagamentos
A questão social também é um alerta feito pelo professor Matheus Martins, que prevê mais chuvas e alagamentos:
“Pode acontecer um período de chuvas intensas nas próximas semanas, mas não nos próximos meses. A tendência é que isso diminua por conta do tempo mais seco, mas como estamos em transição, pode ser que a gente enfrente mais chuvas mais intensas e mais eventos como esse. Isso vai acontecer não só pelas chuvas fortes, mas porque tem mais pessoas em áreas de risco”, alerta o especialista em drenagem urbana.
O professor cita um estudo publicado pelo Departamento do Interior dos Estados Unidos, agência responsável pela gestão dos recursos naturais do país, a L.B. Leopold. A pesquisa indica que o crescimento urbano pode aumentar a cheia natural de um rio em até seis vezes, ou seja, a urbanização de uma bacia pode fazer com que as inundações nessa região sejam até 500% maiores.
“Considerando que todos os estudos do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) estejam certos, enfrentaremos um crescimento de até 30% nas ‘Chuvas Intensas’ no Brasil, especialmente na região sudeste. Uma vez que quase toda inundação urbana na região sudeste é fruto de uma chuva intensa, podemos concluir que as inundações urbanas deverão aumentar em 30% também”, explica Matheus Martins ao Metrópoles, professor do Departamento de Recursos Hídricos e Meio Ambiente da escola politécnica da UFRJ.
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Como o volume de chuva é algo que foge ao controle dos especialistas, assim como o verão desse ano que foi mais úmido, a drenagem urbana deveria ser um ponto de atenção nas regiões serranas, encostas e em áreas de rios:
“Desastres naturais ocorrem pelas chuvas, pelos ventos, mas tem que considerar a ocupação do solo, principalmente ocupações irregulares nas encostas. Se fosse na Amazônia, iria absolver por causa da floresta. Aqui não tem como acontecer isso, a cidade não tem condições de absorver esse volume de água”, explicou Valdo Marques.
Chuvas históricas
O desastre em Petrópolis, região serrana do Rio, foi histórico, segundo o especialista. “A chuva que caiu ali no centro, foi de 223 mm em quatro horas. Com o histórico de chuvas que temos desde 1938, podemos dizer que a tempestade teve um tempo de recorrência superior a 500 anos”, explica Matheus Martins.
Para o especialista em drenagem urbana, no estado, é preciso ter mais atenção com a área da Baixada Fluminense, áreas de encosta de forma geral, como Petrópolis, Costa Verde e região serrana. Já as áreas do canal do mangue, na praça da bandeira, zona norte da cidade, o rio Acari e áreas da zona oeste, como Pavuna, são regiões muito planas que tendem a inundar.
“Quando a chuva está forte, não tem muito jeito, mas é necessário planejar a cidade para não expor a população ao risco. Mapear as áreas de maior risco e retirar as pessoas dessa região é essencial. Isso é muito complexo, mas tem que existir sistemas de alertas e orientação de como a pessoa pode sair, para onde ela vai e qual caminho deve ir, se expondo ao menor risco possível”, alerta o especialista.
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