Terreno que motivou chacina no DF fica em área cobiçada por grileiros

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Com extensa área verde e belezas naturais, a região onde fica o terreno que motivou a maior chacina do Distrito Federal é um local cobiçado por grileiros, segundo relatos de moradores. Avaliada em R$ 2 milhões, a propriedade no Itapoã, erroneamente vinculado às vítimas assassinadas, tem cachoeira privativa, ampla área de capim de gado e cerca de 5 hectares — equivalentes a sete campos de futebol.

A reportagem esteve no condomínio Entrelagos, onde fica a chácara, e flagrou pelas redondezas terras fracionadas e terrenos à venda. Em uma tentativa de compra simulada, o Metrópoles apurou que o preço de lotes com área de 1 mil metros quadrados, por exemplo, pode chegar a R$ 365 mil. Contudo, segundo o anunciante, o valor pela propriedade — sem escritura — deve ser pago à vista.

Uma moradora da região, que pediu para não ser identificada, disse que presenciou vizinhos se mudarem “sem explicação” e, pouco depois, “casas serem levantadas” nos terrenos antes ocupados por eles.

“Todos aqui sabem que existe [grilagem]. Inclusive, há cerca de duas semanas, outra área verde, na parte inferior do condomínio, foi desmembrada e está sendo anunciada. Por ter muito verde, rios, terrenos enormes e não ter fiscalização, grileiros têm grande interesse no local. Trata-se de uma área muito cobiçada por eles”, disse a entrevistada.

Veja imagens:

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A Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) informou que o terreno milionário na área seria a causa da barbárie cometida contra 10 integrantes de uma mesma família. As investigações revelaram que os suspeito dos homicídios queriam as terras para vender. O plano para tomar posse da área era assassinar o mecânico Marcos Antônio Lopes de Oliveira, 54 anos, que dizia ser dono das terras, além de toda a família dele.

Entretanto, segundo os verdadeiros proprietários, o local nunca pertenceu a Marcos Antônio. Ele, na verdade, teria invadido o terreno, em 2020, e se recusado a sair. Com isso, os donos da área entraram com um processo judicial contra o mecânico (leia abaixo).

Advogado da família dona do terreno, Cristiano de Freitas Fernandes afirma que Marcos Antônio mentiu sobre ser dono do terreno. “Ele dizia que a propriedade era dele, o que é uma inverdade. Tudo o que aconteceu é uma verdadeira tristeza, ainda mais pelo motivo, pois a família da minha cliente tem os documentos da casa, que comprovam quem são os verdadeiros donos. Portanto, como poderiam vender uma propriedade que não é do Marcos?”, indagou.

Um conhecido da vítima contou à reportagem que, além de declarar ser dono do terreno, Marcos Antônio pretendia vendê-lo. Inclusive, teria afirmado que encontrou um comprador. Semanas depois, o mecânico e toda a família dele foram assassinados.

Questionado sobre um possível envolvimento de grileiros na compra do terreno em que Marcos Antônio, Renata Juliene Belchior, 52, e Gabriela Belchior de Olveira, 25, moravam, o delegado-chefe da 6ª Delegacia de Polícia (Paranoá), Ricardo Viana — que comanda as investigações —, respondeu que não descarta essa possibilidade.

Veja imagens do local antes da invasão:

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Veja imagens do local após a invasão:

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O Metrópoles entrou em contato com o condomínio Entrelagos, mas a administração não quis comentar as acusações de grilagem no local.

Acionada, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação do DF (Seduh) informou que a competência para “fiscalização, denúncias e notificações” de terrenos é da Secretaria DF Legal. A pasta não soube esclarecer se as propriedades levantadas na área são legais e explicou que “precisaria fiscalizar o local para averiguar se está dentro dos parâmetros previstos no decreto de regulamentação”.

A reportagem tentou contato com o DF Legal, mas até a última atualização desta reportagem não obteve retorno. O espaço segue aberto.

Ação judicial

Segundo Cristiano de Freitas Fernandes, advogado dos donos do terreno, o caminho que levou Marcos e a família a viverem por três anos nas terras é “repleto de ilegalidade”.

Conforme relatou o especialista ao Metrópoles, a chácara teria sido adquirida pelos verdadeiros donos em 1982. Anos depois, a dona teria alugado a chácara a uma familiar, que ficou responsável pelo local.

Para cuidar da propriedade, foi contratado, em 2012, um caseiro. Entretanto, seis anos depois, o homem abandonou o emprego, criou uma espécie de documento e “transferiu”, por conta própria, a função para um terceiro.

Ao descobrir o que teria acontecido, os proprietários procuraram esse terceiro para cobrar que ele deixasse o lugar, mas o homem alegou não ter para onde ir e pediu um tempo para procurar uma casa para morar. Os donos, então, permitiram.

Nesse meio tempo, porém, o homem teria “contratado” Marcos para assumir a chácara em seu lugar, sem informar aos donos. Desde então, a vítima da chacina passaria a viver no local.

Quando ficaram sabendo que outra pessoa estaria no imóvel, e tomaram ciência dos antecedentes de Marcos, os proprietários teriam procurado a polícia para relatar o problema e pediram providências. Segundo eles, nada foi feito.

Diante da recusa do homem em deixar a chácara, a família dona do terreno tentou tirar o invasor acionando a Justiça, conforme relatou o advogado ao Metrópoles.

O processo arrastou-se até o fim de 2022, quando os proprietários decidiram iniciar um outro, denominado espólio – conjunto de bens que formam o patrimônio de uma pessoa morta, a ser partilhado no inventário entre os herdeiros ou legatários.

“Quando encerramos esse primeiro processo para da iniciar a outro, acredito que Marcos teria achado que o processo teria terminado ali e que, por isso, ele passaria a ser o dono da terra”, começou o advogado.

Maior Chacina do Distrito Federal

Gideon Batista de Menezes, 55, e Horácio Carlos Ferreira Barbosa, 49, funcionários de Marcos Antônio, queriam o terreno para vender. O plano, então, era assassinar toda a família e tomar posse do imóvel, segundo a PCDF.

Os criminosos começaram a planejar a chacina em outubro. No dia 23 daquele mês, alugaram o cativeiro onde manteriam as vítimas.

Em dezembro, a ex-mulher de Marcos Antônio, Cláudia Regina Marques de Oliveira, 55, vendeu uma casa por R$ 200 mil. Assim, o plano dos criminosos passou a envolver, também, o restante da família de Marcos.

Infográfico com fotos de vítimas da chacina no DF e suas relações familiares bem como com os assasinos - Metrópoles

Em 28 de dezembro, Marcos Antônio, a esposa dele, Renata Juliene Belchior, 52, e a filha do casal, Gabriela Belchior de Oliveira, 25, foram rendidos. O primeiro a ser morto foi Marcos Antônio, no mesmo dia, segundo a PCDF.

Na data, o plano dos criminosos — Gideon; Fabrício Silva Canhedo, 34; Carlomam dos Santos Nogueira, 26; e um adolescente de 17 anos — era render as vítimas e as encaminharem ao cativeiro.

Gideon, então, permitiu a entrada de Carlomam e do adolescente, para simular um roubo à chácara. Horácio Carlos estava no local e fingiu ser vítima. No entanto, Marcos Antônio teria reagido ao suposto assalto e foi baleado na nunca por Carlomam.

Depois disso, o grupo criminoso enrolou Marcos Antônio em um tapete. A vítima estava ofegante e foi levada, com Renata Juliene e Gabriela, para a casa usada como cativeiro, em Planaltina (DF).

Na mesma noite, Marcos Antônio foi esquartejado, ainda vivo, por Gideon e Horácio Carlos. A dupla enterrou a vítima em uma cova improvisada no terreno.

Durante a madrugada, no cativeiro, o adolescente entrou em pânico ao ver a brutalidade da ação, pulou o muro e fugiu do local.

4 de janeiro

Os criminosos levaram Cláudia Regina e a filha dela, Ana Beatriz Marques de Oliveira, 19, para o local do cárcere.

O grupo conseguiu render a vítima ao simular — com o celular de Marcos Antônio — que Gideon e Horácio Carlos ajudariam na mudança para a nova casa de Cláudia Regina, pois ela havia vendido o imóvel anterior.

Quando Cláudia Regina e a filha Ana Beatriz entraram na casa nova, acabaram rendidas por Carlomam, enquanto os demais também fingiam ser vítimas.

As duas foram levadas para cativeiro: Renata Juliene e Gabriela ficaram em um cômodo; Cláudia Regina e Ana Beatriz, em outro.

12 de janeiro

Thiago Gabriel recebeu um bilhete que o chamava, com a esposa Elizamar da Silva, 39, e os filhos do casal, até a chácara no Itapoã. Os criminosos escreveram um termo usado por Marcos Antônio para tornar a mensagem convincente.

Lá, Thiago acabou rendido. A cabelereira Elizamar foi para o endereço só após sair do trabalho, à noite. Ao chegar, também foi feita refém.

Sem apoio do adolescente, que não quis mais participar do crime, o grupo precisou de um novo ajudante: Carlos Henrique Alves da Silva, 27, conhecido como “Galego”.

De lá, os criminosos seguiram para Cristalina (GO), com Elizamar e os três filhos dela, onde asfixiaram as vítimas e queimaram o carro da cabeleireira. Thiago Gabriel ficou no cativeiro.

“Sempre nas ações de queimar corpos e levá-los para fora do DF, estavam presentes Carlomam, Horácio e Gideon. O Fabrício ficava cuidando do cativeiro”, disse Ricardo Viana, delegado responsável pelo caso.

De madrugada, Carlomam, Horário Carlos e Gideon dirigiram com Renata Juliene e Gabriela, no carro de Marcos Antônio, até Unaí (MG). Lá, eles as asfixiaram e incendiaram o veículo com os corpos das vítimas dentro.

Devido às queimaduras, Gideon não participou dos outros assassinatos.

15 de janeiro

Thiago Gabriel, Cláudia Regina e Ana Beatriz deixaram o cativeiro, no Vale do Sol, em Planaltina (DF) ainda com vida. No entanto, foram levados com os criminosos para um terreno no Núcleo Rural Santos Dumont, a cerca de 5km de onde estavam, onde foram esfaqueados perto de uma cisterna. Em seguida, os assassinos jogaram os cadáveres das vítimas dentro do poço.

“Os criminosos sabiam exatamente o local onde esses corpos ficariam. A vítimas saíram da chácara com vida, e quando chegaram ao local dos assassinatos, foram mortas por objeto cortante”, afirmou o delegado Ricardo Viana.

“[Os corpos de] Ana Beatriz, Cláudia Regina e Thiago Gabriel foram jogados no interior da cisterna e, depois, cobertos com pedras, calhas e terra”, completou.

A execução do plano durou 18 dias. Para a Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), os executores da chacina formam uma associação criminosa armada.

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