“Um fórum de debates que alavanca toda a discussão sobre o cinema”. A descrição do pesquisador Ismail Xavier, um dos mais importantes teóricos brasileiros da sétima arte, no documentário Candango: Memórias do Festival, resume bem a importância do Festival de Brasília para produção nacional.
Após dois anos em formato remoto, o evento mais antigo dedicado ao cinema brasileiro volta a movimentar os corredores e salas do Cine Brasília nesta segunda-feira (14/11), em sua 55ª edição, para o deleite de quem conhece a história e relevância de um “candango”, como é chamado o troféu concedido aos vencedores. A mostra segue até 20 de novembro.
Mato Seco em Chamas, de Adirley Queirós e Joana Pimenta, um dos dois longas do Distrito Federal que concorrem à Mostra Competitiva Nacional, estará entre os selecionados para a exibição de abertura.
55º Festival de Brasília: confira a lista de filmes selecionados
Após estrear com sucesso na 72ª edição do Festival de Berlim, conquistar prêmios em países como Grecia, Kosovo, Portugal e França, e arrebatar dois troféus do Festival do Rio — de Melhor Fotografia e Prêmio Especial do Júri, o longa-metragem retorna à cidade em que “nasceu”. “Eu faço filme pensando sempre em Ceilândia. É o lugar em que eu nasci e moro até hoje, onde eu me emociono e tenho vontade de fazer cinema”, contou o premiado cineasta Adirley ao Metrópoles, durante o Festival do Rio.

Na produção, que está entre as favoritas ao Candango de Melhor Filme, um grupo de mulheres descobre petróleo abaixo da favela Sol Nascente, na Ceilândia (DF), possibilitando a cada morador ter seu poço particular para extrair e refinar combustível, em um país que reverbera a dominação ideológica da extrema-direita.
Para Adirley, assim como Branco Sai, Preto Fica, que já venceu o festival em 2017, Mato Seco em Chamas busca descolar a imagem de que capital federal está restrita aos três poderes e incluir pessoas que geralmente estão à margem da cena política.
“Elas [as personagens de Mato Seco em Chamas] fazem um sindicato, abrem um negócio. A desordem é necessária pra criar uma linguagem e criar uma reação. A gente vive em um país que a ordem oprime. A ordem é a perversidade. Então é necessário um pouco mais de desordem tanto no conceito do filme quanto nos modelos de produção”, explica Adirley, que já acertou a distribuição do filme no circuito comercial para o início de 2023.
Adirley Queiroz
Mostra Competitiva Nacional
Além de Mato Seco em Chamas, o DF conta com o longa Rumo, de Bruno Victor e Marcus Azevedo, na Mostra Competitiva Nacional. A obra explora a trajetória de implementação das cotas raciais em universidades brasileiras.
O debate político-social brasileiro também aparece no restante da programação de longas. O documentário fluminense Mandado, de João Paulo Reys e Brenda Melo Moraes, investiga o sistema penal brasileiro; enquanto o título paulista-amazonense A Invenção do Outro, de Bruno Jorge, acompanha expedição humanitária do indigenista Bruno Pereira na Amazônia em busca da etnia isolada dos Korubos.
Entre as ficções selecionadas, o mineiro Canção ao Longe, de Clarissa Campolina, debate questões de classe, família, tradição, raça, gênero e identidade, e o pernambucano Espumas ao Vento, de Taciano Valério, contrapõe o labor da arte à expansão de igrejas neopentecostais pelo Brasil.
Na seleção de curtas estão a ficção Big Bang (MG/RN), de Carlos Segundo; Ave Maria (RJ), de Pê Moreira; Lugar de Ladson (SP), de Rogério Borges; Calunga Maior (PB), de Thiago Costa; Sethico (PE), de Wagner Montenegro; Anticena (DF), de Tom Motta e Marisa Arraes; Nossos Passos Seguirão os Seus (RJ), de Uilton Oliveira; Escasso (RJ), de Clara Anastácia e Gabriela Gaia Meirelles; São Marino (SP), de Leide Jacob; Capuchinhos (PE), de Victor Laet; Nem o Mar Tem Tanta Água (PB), de Mayara Valentim; e Um Tempo Para Mim (RS), de Paola Mallmann de Oliveira.
Mostra Brasília
Tradicional no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, a Mostra Brasília exibirá o longa O Pastor e o Guerrilheiro, que marca o retorno do veterano cineasta José Eduardo Belmonte ao festival que o revelou. O diretor Felipe Gontijo, por sua vez, apresenta Capitão Astúcia, aventura que une neto e avô para debater envelhecimento. Pedro Lacerda documenta em Profissão Livreiro a história dos candangos Ivan Presença e Chiquinho da UnB nos desafios impostos pelos novos modelos de negócio do mercado editorial. Por fim, Wesley Godim apresenta Afeminadas, documentário sobre o universo drag queen de Brasília.
A seleção de curtas também aponta para um vasto panorama da nova produção local. Desamor, de Herlon Kremer, aborda o delicado tema da separação; Super-heróis, de Rafael de Andrade, celebra os heróis do cotidiano; Plutão não é tão longe daqui, de Augusto Borges e Nathalya Brum, cria a fictícia favela Plutão, às margens da Ceilândia, onde se abrigam opositores de um governo autoritário; e Manual da Pós-verdade, de Thiago Foresti, investiga o lugar da produção jornalística em meio às fake news.
Carolina Monte Rosa apresenta Tá tudo bem, curta que debate diferenças sociais atenuadas pelo isolamento social; e Juliana Corso exibe Virada de jogo, filme que conecta narrativas femininas através da dor e do amor próprio. Marcelo Cuhexê traz ao festival Levante pela Terra, obra captada no acampamento homônimo, realizado durante a pandemia, em Brasília, contra o avanço de leis que impactariam nos direitos indígenas; e Vínícius Schuenquer apresenta Reviver, filme sobre perdas do passado e superação.
O horário de exibição dos filmes e a programação completa acesse está disponível no site do evento: https://festcinebrasilia.com.br/programacao/
Abertura do 55º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro
De 14 a 20 de novembro, às 19h30, no Cine Brasília (SHCS EQS 106/107), e às 20h nos complexos culturais de Planaltina (Avenida Uberdan Cardoso, St. Administrativo Lote 02) e Samambaia (Quadra 301 Conjunto 05 Lote 01). Os ingressos para o Cine Brasília estarão disponíveis na bilheteria 2h antes do início da sessão. Informações, inscrições para oficinas e programação completa no site.
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