PERU: O AUTOGOLPE DE ALBERTO FUJIMORI

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PERU: O AUTOGOLPE DE ALBERTO FUJIMORI

Salin Siddartha

Assim como fizeram Adolf Hitler e Benito Mussolini, respectivamente, na Alemanha e na Itália, Alberto Fujimori construiu uma ditadura no Peru referendada pelo voto popular. Com o chamado “Autogolpe”, em 5 de abril de 1992, o Presidente Fujimori, constitucionalmente eleito de forma democrática pelo povo peruano em 1990, terminou por dissolver o Congresso, interveio no Poder Judiciário, no Ministério Público, tomou vários meios de comunicação (rádios, TVs, jornais e revistas) e promoveu perseguição a membros da oposição, com apoio das forças armadas, suas principais aliadas.

Fujimori foi prestigiado e financiado pelo capital monopolista internacional e promoveu a desregulamentação selvagem da economia, causando imenso dano ao Peru. Logo após tomar posse, ele lançou um programa de contrarreformas econômicas, acabando com subsídios, privatizando empresas estatais e reduzindo o papel do Estado.

Para estimular investimentos estrangeiros, o governo dele destruiu os direitos trabalhistas, inviabilizou a possibilidade de industrializar o país, aumentou a informalidade, mas iludindo o trabalhador informal, levando-o a crer que poderia enriquecer, caso se propusesse a isso. Como consequência, a taxa de desemprego ultrapassou 60%.

Alberto Fujimori chegou ao poder com a promessa de um milagre econômico e social, porém ele debilitou as instituições públicas, violou os direitos humanos, estabeleceu uma política econômica com enfoque em uma forte concentração da riqueza, implantou a corrupção generalizada e um regime político baseado no clientelismo. A título de impedir a proliferação da pobreza, sua política misógina forçou a esterilização de mais de 250 mil mulheres, principalmente indígenas.

O chamado “Autogolpe” de abril de 1992 foi desencadeado tendo como pretexto o combate ao terrorismo, ao tráfico de drogas e à corrupção, contudo implantou uma ditadura sanguinária e corrupta. A implantação da ditadura foi uma reação de Fujimori à resistência do Congresso aos esforços do governo em adotar políticas preconizadas pelo FMI e pelo Banco Mundial, especialmente as medidas de austeridade previstas no Consenso de Washington.

Ao dissolver o Congresso, Alberto Fujimori encarcerou a maioria dos líderes partidários. Ele alegou que o Estado Democrático de Direito o impossibilitava reformar o sistema político do país para realizar mudanças estruturais. De forma incoerente, Fujimori afirmava que o “Autogolpe” era uma mudança de rumo que ia ao encontro da vontade do povo peruano e que, com as mudanças, se restabelecia a legitimidade do Estado e a verdadeira prática democrática (sic). Com o golpe estabelecendo o que Fujimori chamou de “Governo de Emergência e Reconstrução Nacional”, ele conseguiu neutralizar seus adversários políticos, suspender a Constituição, convocar eleições para um Congresso Constituinte, que lhe deu maioria, elaborar e organizar uma nova Constituição do Peru e dar ao Executivo todos os poderes de legislar. Fujimori cerceou a independência do Poder Judiciário com uma declaração de estado de emergência e toque de recolher. O golpe foi um assassinato à democracia, dando margem a que se praticassem crimes contra os direitos humanos, dizimando-se dezenas de milhares de pessoas convertidas em inimigas do Estado. Inúmeros

assassinatos foram praticados por grupos paramilitares, além de chacinas perpetradas diretamente por comandos militares genocidas das forças armadas peruanas.

A ditadura de Fujimori montou um esquadrão da morte, denominado “Grupo Colina”, para realizar operações especiais. Submetidos a julgamento em 1995, todos os assassinos do Colina foram anistiados pelo governo e continuaram a praticar os mesmos crimes. Só para que se tenha uma ideia da barbárie implantada por Fujimori no Peru, em 1991, agentes do Estado assassinaram 15 pessoas, entre elas um menino de 9 anos de idade, em um local onde se acreditava que participavam membros da organização de esquerda Sendero Luminoso, o que, posteriormente, foi descartado. Em 1992, oito estudantes universitários e um professor foram alvejados em plena universidade por, supostamente, realizarem uma reunião de crítica ao governo, e seus cadáveres foram enterrados em valas comuns. O fujimorismo criou um sistema de desinformação e manipulação da opinião pública, o qual acusava de “terrorista” aos que professavam ideologia de esquerda democrática, aos operários, camponeses e estudantes que protestavam pela perda de seus direitos. O custo institucional do “Autogolpe” foi altíssimo; o Poder Judiciário do Peru, até hoje, vê suas ações comprometidas por conta do estrago realizado em 1990. A suspensão da democracia como argumento para suspendê-la levou à corrupção e ao autoritarismo.

O fujimorismo encarnou uma quadrilha voraz que se aliou a empresários e jornalistas corruptos, milícias de extermínio, grupos paramilitares e, à ignorância de setores da sociedade, instalou um corrupto regime de intimidação que, fingindo assegurar a paz, buscava eternizar-se no poder. A ditadura de Fujimori subornou, extorquiu e neutralizou os meios de comunicação, de forma que o regime tinha uma oposição na imprensa, muito reduzida e abafada, apenas para servir de argumento ao ditador de que ele respeitava a liberdade de imprensa.

Com a ajuda do Chefe do Serviço de Inteligência, Vladimir Montesinos, Alberto Fujimori montou um esquema de subornos e de chantagem a políticos, juízes, jornalistas e empresários. E, sob o pretexto de conter o Partido Comunista do Peru, a ditadura montou um império da cocaína. Fujimori apropriou-se de 15 milhões de dólares de fundos nacionais, bem como desviou fundos das forças armadas e do Serviço de Inteligência Nacional-SIN para financiar uma das suas reeleições. A Constituição e as leis foram adaptadas às necessidades da ditadura, para que ele e seus cúmplices do Parlamento pudessem reeleger-se. Em 1996, Alberto Fujimori manobrou ilegalmente para candidatar-se à presidência pela terceira vez, apesar de a Constituição não o permitir.

Durante o governo de Alberto Fujimori, o neofascismo desenvolveu-se facilmente. O “Autogolpe” de Fujimori foi despertado pelos amantes do autoritarismo e engrossado por eleitores que não se importavam com o regime, eleitores esses que não ligavam o mínimo quanto ao governo ser democrático ou fascista. Em verdade, a direita peruana sempre representou uma classe dominante agressiva, entregue totalmente às multinacionais. Ela sempre representou o autoritarismo, a presença de soldados nas ruas, pena de morte e mão-de-ferro que acabasse rapidamente com os delinquentes.

Hoje, Fujimori encontra-se preso e condenado. Que essa triste e, graças a Deus, fracassada experiência, também sirva de alerta para a conjuntura pela qual estamos todos passando.

Cruzeiro-DF, 17 de maio de 2020

SALIN SIDDARTHA

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