Crítica: A Forma da Água, um romance mágico assinado por Del Toro

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    A Forma da Água é um filme sobre a necessidade de amor em tempos de medo e desespero. Sejam eles os da Guerra Fria, ambientação do novo longa do mexicano Guillermo del Toro, ou os de hoje, em que certas lideranças mundiais parecem jogar a humanidade em um período de incertezas sociais e políticas.

    Amante de filmes de monstro (Círculo de Fogo, Hellboy) e contos de fada (O Labirinto do Fauno, A Espinha do Diabo), Del Toro atinge um equilíbrio que talvez nenhum diretor da Hollywood atual seja capaz de calibrar: combinar sua obsessão por criaturas estranhas (mas bondosas) com tintas de melodrama clássico e comentário social.

     

    Elisa Esposito (Sally Hawkins), uma faxineira muda, passa as noites limpando corredores e interiores de salas e laboratórios de uma instalação governamental de pesquisa. Num dia de trabalho qualquer, ela e Zelda (Octavia Spencer), amiga e colega de trabalho, conhecem o mais novo objeto de estudo de cientistas e militares: uma criatura aquática que parece tão alienígena quanto familiar.

    A zeladora se vê tão fora desse mundo quanto Zelda, vítima de racismo diariamente, e Giles (Richard Jenkins), seu colega de quarto gay e em crise na carreira de publicitário. Ao se aproximar do tão maltratado ser anfíbio, encontra nele um confidente inesperado: alguém para amar e se sentir amada.

    As formas do amor
    Del Toro constrói uma fábula em torno de praticamente todos os tipos de renegados de ontem e hoje – o que poderia parecer pueril nas mãos de um diretor menos habilidoso. Mas o mexicano consegue verter qualquer mera metáfora em um romance genuinamente mágico, tão incomum quanto mundano.

    Em certo sentido, o cineasta parece tão embevecido pela história que quer contar que o escopo emocional do filme soa às vezes um tanto programado – sobretudo na primeira hora.

    Mesmo quando o arco de Elisa parece vacilar, Del Toro acha soluções imediatas no humor de Zelda e Giles e nos rompantes violentos de Richard (Michael Shannon), chefe de segurança do laboratório e verdadeiro monstro do filme.

    Piscadinhas cinéfilas comparecem em peso. O apartamento dividido entre a faxineira e o publicitário faz divisa com um cinema de rua em crise. E Del Toro narra bonita redenção de uma criatura cuja matriz é o clássico O Monstro da Lagoa Negra (1954).

    Se a fantasia é o último refúgio de um mundo instável e intolernate, A Forma da Água vê na fábula uma maneira de melhorar as coisas aqui fora: contando histórias que nos unem.

    Avaliação: Ótimo

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